quarta-feira, 16 de novembro de 2011

A apresentação do meu primeiro livro

APRESENTAÇÃO

Um conto, por sua natureza, corresponde sempre ao nosso próprio ser que também se desenvolve no tempo; assim Jorge Luis Borges entendeu a dinâmica do fio narrativo que prende as histórias e as vidas. Isso me pareceu muito forte quando li a história de Sanumá, pois além de ser um conto de ótimo ritmo é também um conto sobre o tempo e sobre o amor, duas grandezas direcionadas ao autoconhecimento humano.
Pelas matas povoadas da sabedoria indígena, a história de Sanumá brota como em um poema. Leo Janicsek parece nos convidar ao princípio das tradições orais, às mais primitivas cosmologias reveladas à roda da noite, entre cantos e pajelanças, pela voz do guardião das histórias. Seu conto é a comunicação poética das mais profundas necessidades humanas diante do mundo apressado e pragmático, cultivado pela sociedade de consumo. Enquanto o homem se dissolve na massificação que o iguala como produto, o conto – mito nos provoca a conjugar tempo e existência ao nos apresentar a lenda de amor de Sanumá, a flor dos sonhos, uma índia com suficiente coragem de amar dentro do limite da finitude humana, e que enfrenta com maturidade e ousadia os perigos da escolha.
A linguaguem de Leandro Janicsek é rica em metáforas e grandiosas comparações, as palavras tecem frases de forte impacto seja no lirismo e na musicalidade das frases ou na sabedoria das sentenças. O espaço narativo revela uma natureza vivaz, referência para o humano e este, por sua vez, todo mergulhado na realidade e divindade desta natureza. A natureza é personagem onipresente e representa a própria consumação da beleza e do bem.
Sanumá, a flor dos sonhos é sobretudo um conto de amor, sentimento apresentado como única possibilidade para vencer o medo e encarar o tempo e a morte, para conquistar rumo justo à consumação dos destinos. O amor de Sanumá não assemelha-se ao propagandeado pelo mercado de emoções superficiais pois é uma doação livre de si, a metáfora do tempo-vida oferecida ao outro.
O drama de Sanumá é vivido localmente junto à viva paisagem das margens do Jeribucaçu, no Campo Cheiroso, mas se comunica com os profundos problemas interiores vividos pelo homem em qualquer lugar e em qualquer tempo. São universais porque Sanumá, em sua busca, lida com os profundos mistérios de nossa maturação, com os profundos limites da travessia: amor e morte. São os impulsos das estações, são a garantia de uma sabedoria sempre jovem, são a aniquilação e a primavera.
A história de Sanumá é verdadeiramente a história de uma travessia, de uma saga espiritual significada pelo amor como expressão da mais sublime verdade e sacrifício. Leandro Janicsek produz o efeito, nesse sentido, de uma literatura do espírito, recriando pelas vias da linguagem mitopoética a busca humana pela sua significação.

Jorge Alessandro R. Sousa,
Professor de literatura brasileira